Pesquisas recentes debruçaram-se sobre o uso de técnicas de segurança
nas cartas da realeza europeia, incluindo a Rainha Isabel, Catarina de’
Medici e Maria Rainha dos Escoceses.
Para salvaguardar a
correspondência real mais importante dos olhares de bisbilhoteiros e
espiões no século XVI, os escritores usavam um meio complicado de
segurança: começavam por cortar um bocado do papel, dobravam a carta e
depois usavam o pedaço destacado para “coser” e trancar o documento. Ou
seja, a carta transformava-se no próprio envelope.
Isto
significa que, se um espião quisesse ler o seu conteúdo, teria de abrir a
fechadura – um ato impossível de passar despercebido, escreve o New York Times.
Catherine
de’ Medici, rainha consorte de França entre 1547 e 1559, utilizou o
método em 1570, numa altura em que governou o país enquanto o seu filho,
o rei Carlos IX, estava doente. E a Rainha Isabel fê-lo em 1573 como
governante soberana de Inglaterra e da Irlanda. Já Maria Rainha dos
Escoceses usou-o em 1587, poucas horas antes de ser decapitada.
“Estas
pessoas sabiam mais de uma forma de enviar uma carta e escolheram
esta”, disse Jana Dambrogio, autora principal de um estudo que detalha o
uso da técnica pelos políticos da era renascentista.
“Foi
preciso ter muita confiança para fazer uma fechadura em espiral. Se
cometesse um erro, teria de começar tudo de novo, o que poderia levar
horas a reescrever e a coser de novo. É fascinante. Fizeram grandes
esforços para melhorar a sua segurança”, notou.
O uso deste
método é a mais recente descoberta de um grupo de estudantes do M.I.T.,
que lhe chamou “letterlocking” – uma forma de arte usada pela realeza
europeia para garantir a segurança das comunicações escritas.
No
início do ano passado, a equipa revelou o desenvolvimento de uma
técnica de realidade virtual que permite que os investigadores possam
dar uma espreitadela em cartas fechadas, sem as rasgar, nem danificar o
registo histórico.
Agora, num artigo pormenorizado publicado
no mês passado no Electronic British Library Journal, mostram exemplos
da espiral e postulam que o método “se espalhou pelas cortes europeias
através da correspondência real”.
Embora a utilização daquela
técnica tenha desaparecido na década de 1830, com o aparecimento de
envelopes produzidos em massa e de sistemas melhorados de entrega de
correio, é agora visto como um precursor fascinante da encriptação
generalizada utilizada globalmente nas comunicações eletrónicas.
No
artigo, os autores baseiam-se em cartas, bem como ilustrações gráficas e
descrições detalhadas do processo, para revelar o que aprenderam em
duas décadas de estudo, sendo que o principal objetivo do artigo é
ajudar outros académicos a identificar quando se depararem com cartas
históricas nas quais a técnica tenha sido usada.
Os autores
dizem ainda que coleções de bibliotecas e arquivos contêm frequentemente
exemplos de cartas que foram fechadas daquela forma – o que significa
que estão escondidas à vista de todos.
“Esperamos [que as nossas
descobertas se tornem] “novas ferramentas de pesquisa arquivística e
permitam até mesmo que artefactos muito conhecidos sejam examinados de
novo”, dizem.
Um dos casos de estudo usados para o artigo é uma
carta escrita em 1570 por Catherine de’ Medici, que desempenhou papéis
de liderança durante quase meio século na vida política da França.
O
documento, que foi encontrado à venda online e adquirido pelo M.I.T., é
uma carta escrita por Catherine para Raimond de Beccarie, um soldado,
político e diplomata francês. Um vídeo do M.I.T. mostra uma reencenação de como Catherine ou um dos seus assistentes terá dobrado e trancado a carta.
Os
autores descrevem o procedimento com considerável detalhe porque a
carta sobrevivente reteve até 99 por cento do complicado mecanismo de
bloqueio, permitindo uma reconstrução completa dos passos individuais.
https://zap.aeiou.pt/como-a-realeza-europeia-escondia-as-suas-cartas-de-olhares-alheios-456480
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